Ainda hoje, falar sobre racismo é tabu para algumas pessoas. Seja por não compreenderem pessoalmente a importância dessa discussão ou por não se sentirem confortáveis fazendo parte dela. Infelizmente, isentar-se dessa conversa não é opção válida para muitas famílias, que precisam orientar seus filhos desde pequenos sobre o papel do racismo em nossa sociedade. Apesar do que motiva cada um a abordar esse assunto em casa, uma coisa é certa: quanto antes se escolhe falar sobre racismo com as crianças, melhor. Neste post, damos dicas sobre como iniciar esse diálogo sutilmente e qual abordagem ter a partir de cada idade.

Há quem acredite ser insignificante conversar com crianças sobre o racismo, uma vez que sendo tão jovens elas podem não o perceber ou sequer replicá-lo. Entretanto, estudos apontam que crianças a partir dos 3 anos de idade já demonstram escolhas influenciadas pela cor da pele – como, por exemplo, se opor a brincar com bonecos de personagens negros, em predileção a personagens brancos. Ignorar ou evitar esse assunto não serve como proteção à criança, isso apenas a expõe a situações às quais ela não saberá como reagir – sendo ela alvo ou, inconscientemente, vetor do racismo.
Como falar sobre racismo de acordo com a idade
Crianças percebem o mundo à sua volta de maneira diferente dos adultos, e suas percepções mudam conforme elas vão ficando mais velhas. Por isso, o ideal é que existam abordagens diferentes do mesmo assunto para cada faixa etária.
Crianças menores de 5 anos
Como mencionado anteriormente, a partir dos 3 anos de idade, crianças já identificam diferenças raciais e, conforme crescem, passam a fazer escolhas influenciadas por essas diferenças. Então, é interessante que, logo cedo, pais e responsáveis criem uma base forte que facilitará falar sobre o racismo quando as mesmas crianças forem mais velhas.
Reconheça as diferenças e as celebre
Crianças são naturalmente bastante observadoras, uma vez que ainda estão no processo de reconhecer o mundo e a si mesmas. É comum que, até os 5 anos de idade, elas observem as diferenças à sua volta e façam comentários a respeito. Neste momento, pais e responsáveis devem reconhecer essas diferenças e reafirmar que, apesar delas, todos nós temos bastante em comum. Mesmo sendo indivíduos de beleza singular, compartilhamos muito com o outro, seja do ponto de vista pessoal ou cultural. Se a criança fizer algum comentário inocente sobre características físicas de outra pessoa com base em sua cor de pele, valide o que foi dito, reformule a ideia da criança se preciso for e, então, celebre o que a criança e a pessoa observada têm em comum: sejam características físicas, estéticas ou relacionadas às suas personalidades. Desta maneira, a criança compreende que, apesar das diferenças, temos muito mais coisas que nos assemelham às pessoas à nossa volta do que costumamos perceber.
Responda perguntas de maneira receptiva
Se coloque à disposição para responder – com paciência e sutileza – as questões que a criança tiver. Permita que ela enxergue em você a mais confiável fonte de conhecimento. Evitar falar sobre questões de raça ou silenciar a curiosidade de uma criança, pode reforçar a ideia de que o assunto é um tabu e de que a melhor maneira de lidar com ele é simplesmente ignorando-o, o que já sabemos que não é o ideal. Incentive sempre o diálogo aberto.
Introduza o conceito de justo e injusto
Crianças dessa faixa etária costumam já compreender o conceito do que é justo e injusto, mas tendem a observar estas situações apenas quando o benefício, ou a falta dele, afeta principalmente a elas mesmas. Nesse estágio, é interessante falar sobre quão injusto e inaceitável é o racismo, mas fazendo um comparativo com situações em que a criança já tenha se sentido injustiçada. Isso pode colaborar para que ela faça um link mais claro entre causa e efeito.
Crianças entre 6 e 11 anos
Nessa faixa etária, as crianças passam a se relacionar com um maior número de pessoas no seu dia a dia e são mais expostas a informações externas, o que pode tornar mais complicada a compreensão de situações e sentimentos. Nesta fase, é importante não apenas responder às dúvidas que surgem, mas também buscar compreender o que a criança sabe – com base no tipo de informação a qual ela tem acesso fora de casa.
Demonstre curiosidade sobre o que a criança aprende
Depois de criar uma boa base de troca ao responder as perguntas da criança de maneira receptiva, busque inverter os papeis e passe a questionar a criança sobre o que ela aprende na escola, com os amigos ou na mídia. Pais e responsáveis podem controlar o que a criança ouve em casa, mas esse controle não se estende aos outros locais que a criança frequenta sozinha, por isso é importante demonstrar interesse e sondar o que ela tem aprendido.
Discuta com ela sobre os conteúdos que ela consome
Além do interesse sobre a rotina da criança longe de casa e o que ela tem aprendido na escola ou com os amigos, é importante demonstrar também curiosidade sobre o que a criança consome como entretenimento dentro e fora de casa, sejam livro, filmes, desenhos ou séries. Encontre oportunidades de conversar sobre os estereótipos ou preconceitos que podem ser percebidos no conteúdo que ela consome.
Sugestões de livros sobre diversidade, inclusão e representatividade
Turma da Mônica – Bem-Me-Quer: Junto e Misturado
Turma da Mônica – Bem-Me-Quer: A Grande Festa
Coleção Crianças Famosas – Chiquinha Gonzaga
Coleção Crianças Famosas – Cartola
Coleção Crianças Famosas – Aleijadinho
Fale abertamente sobre diversidade e inclusão
Diversidade e inclusão são pautas que pais e responsáveis devem abordar ao falar sobre racismo com crianças. Conversas honestas sobre estes temas ajudam a encorajar os pequenos a buscarem sempre a melhor fonte de aconselhamento quando o assunto parecer delicado, ao invés de simplesmente se guiarem pela opinião dos colegas ou de pessoas com as quais eles não costumam ter esse tipo de conversa.
Crianças maiores de 12 anos
A partir dessa idade, a criança já compreende melhor conceitos abstratos e consegue expressar com mais clareza seus sentimentos e pontos de vista. Com isso, a tarefa de falar sobre racismo em casa se torna algo mais objetivo.
Questione o que ela aprende sobre racismo no dia a dia
Pergunte para a criança o que ela sabe e o que aprende na escola ou com os amigos sobre racismo e discriminação. Questione sobre situações que ela possa ter presenciado e qual o tipo de reação que ela observou das pessoas que presenciaram o mesmo. Busque saber o que ela fez ou teria feito naquela situação se tivesse uma oportunidade de intervir.
Inicie conversas que mostrem novas perspectivas
Busque por oportunidades de apresentar novas perspectivas para a criança com base em situações ou eventos midiáticos aos quais ela tenha tido contato. Um ótimo exemplo é o recente descontentamento do público pela produção live-action de A Pequena Sereia, que conta uma princesa Ariel negra. Com base na repercussão midiática a respeito do assunto, essa seria uma perfeita oportunidade para conversar com a criança sobre representatividade e protagonismo negro.
Encoraje a criança a engajar em debates e eventos
Por último, mas não menos importante, encoraje a criança a falar sobre racismo também fora de casa. Se o que ela aprendeu for de uso individual, o impacto social desse aprendizado será mínimo. Engajar na discussão sobre igualdade, inclusão e respeito não só é importante para o desenvolvimento ético da criança, mas colabora também para uma sociedade mais justa e igualitária.
“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.”
Nelson Mandela
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Consciência Negra na infância: como falar sobre representatividade com as crianças.
Fontes
https://www.unicef.org/parenting/talking-to-your-kids-about-racism
https://www.pbs.org/parents/thrive/how-to-talk-honestly-with-children-about-racism
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